Cristina Helou Gomide


MUSEU: ESPAÇO DE REFLEXÃO

“No Brasil, as políticas de preservação do patrimônio foram sempre marcadas pela improvisação ou pelo uso político da cultura (...) acabou por cristalizar os elementos do nacionalismo autoritário com as intenções modernistas, em tentativas e com objetivos de recuperar o passado para alcançar uma definição de identidade nacional.” (FENELON, 1999, p. 290)

Narrar sobre museus e visitação pode parecer uma tarefa singela, mas não o é, sobretudo porque museu carrega estigmas, reforçados por expressões como “Quem gosta de passado é museu”. Além disso, os espaços dos museus são constantemente utilizados por educadores e educadoras, o que torna o debate, ainda mais necessário. Tratando-se de uma temática muito ampla, longamente estudada por vários pesquisadores, buscamos fazer um recorte, apresentando algumas considerações sobre nossas reflexões, que vem sendo realizadas ao longo desses últimos vinte anos. Trazemos para o debate, o museu do Antigo Palácio Conde dos Arcos, localizado na Cidade de Goiás-GO, uma vez que este é nosso objeto de investigação desde a década de 1990. Para tanto, utilizamos de algumas narrativas: o guia do museu, visitantes turistas, alunos e alunas da Universidade. Optamos por não citar nomes, embora tenhamos a autorização dos narradores.

Em 1999, quando estávamos em uma das pesquisas in loco, o então guia do museu permitiu gravar seu trajeto com dois grupos de pessoas. O primeiro, com estudantes do ensino fundamental de uma escola estadual de Goiânia. O segundo, com alunos e alunas da Universidade Católica de Goiás do curso de História. E então, segue trechos de sua fala:

“Sejam bem vindos à antiga Capital. (...) A cidade tem duzentos e setenta e um anos, a cidade é de 1727, e vocês já observaram a antiga capital. As casa de Goiás é simples em termo de arquitetura. Inclusive o próprio palácio, professoras. Talvez as os meninos vão ta imaginando que seja um palácio cheio de ouro, obra de arte. Nada disso! O Palácio Conde dos Arcos não foi projetado. Simplesmente D. João V autorizou o governador da capitania de Goiás a adquirir algumas casas. Foram cinco casas, incluindo a casa de fundição, aí foram ampliando. Aí o Palácio formado ele é tipo um armazém ou um caixotão. Esse prédio tem 243 anos (...) o mobiliário varia do século XVIII e a década de sessenta. É uma mistura de época (...)
Na época do Império era realizada uma missa aqui na Matriz de Santana. Assim que terminava eram convidadas algumas pessoas importante, os fidalgo, pra vim ao Palácio (...)
Quem imaginava que um dia você ia vim ficar diante dessa mesa. Foi a mesa que Pedro Ludovico assinou a transferência da capital (...) deixou de ser capital em 1937 (...) e o motivo que ele alegou para transferir a capital, eu vou dizer pra vocês. Ele alegou o saneamento básico, que é precário até hoje (...)
Essa porcelana é dos anos trinta, pertencia a Pedro Ludovico, a mesa é do século XVIII, tem mais de duzentos anos, foi a primeira mesa aqui do refeitório, e a mesa é de encaixe. É...antigamente, professoras, não usava prego no mobiliário, era o próprio cravo de madeira (...) olha o rádio eletrola aqui dos anos quarenta, já pertenceu ao Pedro Ludovico.” (Guia do Museu Antigo Palácio Conde dos Arcos, dezembro de 1999)

Para os que desconhecem a história de Goiás, é preciso situá-los. Pedro Ludovico foi nomeado interventor do Estado de Goiás por Getúlio Vargas em 1930. Ele entrou no lugar de Totó Caiado, família de tradicional poder político local. Vale lembrar também que Ludovico foi o único interventor no âmbito nacional que permaneceu no poder durante o mesmo período de Vargas à época do “Estado Novo”, de 1930 a 1945 (RIBEIRO, 1999).

Em pesquisas realizadas no final da década de 1990, entrevistamos os moradores da cidade que permaneceram na antiga capital mesmo após a transferência, e o que pudemos perceber foi uma memória de mágoa, vazio, saudade e abandono. Para os narradores daquele momento, Pedro Ludovico os traiu e abandonou (GOMIDE, 2005).

Voltemos ao museu. Remetendo-nos à importância histórica do lugar, o guia exalta a casa e os tempos áureos de funcionamento do Palácio. Ressalta peculiaridades presentes no mobiliário que se refere aos séculos XVIII e XIX, bem como objetos que remontam a história vivida por Pedro Ludovico, como é o caso da eletrola. Existe aí, um discurso que busca trazer um “grande nome” para reforçar o local como espaço de importância, assim como quando traz “na época do Império”.

Visualizamos o museu como um local em constante movimento, onde o visitante é, ao mesmo tempo, ator e espectador, e o guia também. Ocorre que o museu carrega um estigma construído historicamente, de que ele é o lugar da contemplação, do silêncio, e dos "grandes nomes”. Cansamos de viajar e nos depararmos com os museus locais que contam a história de alguns eleitos. Lembramo-nos de certa vez, no sul do país, visitar uma pequena cidade, cujo museu municipal era apresentado assim: “aqui é o cachimbo usado por fulano”; esta é a máquina de escrever que o fulano gostava de usar; esse é um dos chapéus dele; e assim por diante. O que pretendemos dizer, é que mesmo o museu reforçando a história de uns e não de todos, a visitação nos possibilita novas interpretações, colocando-nos em situações diversas. Ou seja, podemos gostar desse museu, achar interessante, não nos identificarmos, como foi nosso caso, ou simplesmente achar inútil e criar uma noção de museu própria. Tem muito mas o que não se pode negar, é que ainda carregamos uma noção de museu que busca associar sua exposição a um nome ou feito eleito historicamente. Por isso tende-se a achar que o museu é um lugar fossilizado, que não tem movimento. Isso serve para reforçar uma noção de história que nos exclui. Vejam, então, a importância do trabalho do professor de história em uma visitação ao museu. Na verdade, tem-se a possibilidade de reinterpretar o museu a cada visitação, o que ocorre é que a história que produzimos, sob influência do projeto de nação no Brasil, nos faz lembrar sempre de datas cívicas, mas nos coloca a esquecer de outras (LIMA e FONSECA, 2004). Ninguém se esquece do 15 de novembro ou do 7 de setembro (BITTENCOURT, 1888). Em Goiânia, a atual capital do estado de Goiás, temos o 24 de outubro, aniversário da cidade. Nós, da academia, há tempos já desconstruímos a história de Pedro Ludovico como um herói ou um homem à frente de seu tempo, a tornamos pública, levamos para as salas de aula e para debates públicos, publicamos livros e produzimos materiais  didáticos. No entanto, a matéria que é publicada no Jornal O Popular (veículo jornalístico de maior circulação na região) é de Ludovico, “um homem á frente de seu tempo” – como se isso fosse possível. Ainda assim, seguimos reinterpretando a história regional e indo á contramão também do museu Pedro Ludovico Teixeira, ex-residência do interventor, onde o guia também reproduz a história “oficial”.

Nos últimos dois semestres de 2016, ministramos a disciplina “Goiás – História e Ensino da História”. O encerramento da disciplina ocorre na Cidade de Goiás, com um visita campo, onde realizamos visitação também aos espaços de museus. Nessa disciplina, dá-se um grande foco à questão da transferência da capital de Goiás para Goiânia, Goiás como cidade histórica, a construção da noção de preservação, a Goiânia, dentre outras questões, sobretudo porque temos produzido muitas pesquisas nesse âmbito. Um dos papéis da disciplina é exatamente proporcionar novas interpretações sobre a história de Goiás, questionando a história construída oficialmente, trazendo as pessoas para a história, de modo que se sintam pertencentes e produtoras da história do local onde vivem. Assim, quando vamos à Cidade de Goiás, esperamos que os debates realizados em sala se reflitam criticamente nas visitações a museus. A fala do guia do Museu Antigo Palácio Conde dos Arcos, permanece na mesma perspectiva. Apresentamos a seguir comentários que incluem os alunos e alunas visitantes. Seguem algumas das impressões dos e das discentes:

“Durante a visita ao Museu Palácio Conde dos Arcos na Cidade de Goiás, o que mais chamou a atenção foi o fato de podermos conhecer um local que foi construído no século XVIII juntamente com alguns objetos e móveis que nos remete a vida de um governante naquela época.” (Alunx da disciplina de história de Goiás, 2/12/2017)

O discente se sentiu marcado pelo mobiliário do século XVIII, mas o interessante é que o museu possui a grande maioria de móveis pertencentes ao século XX. Ocorre que o espaço não é tombado pelo IPHAN, nem é legitimamente um espaço de museu. É um centro cultural aberto à visitação pública e foi criado na década de 1980. Grande parte dos móveis que se encontram ali foram levados do Palácio do governo em Goiânia, à época de sua criação. No entanto, o que fica no imaginário dos visitantes, é o que os remete ao passado mais longínquo. Interessante notar que já havíamos abordado o museu em sala de aula, e os bens expostos na exposição permanente foram foco de reflexão. Sobre essa necessidade que temos de aproximar o museu a “excepcionalidades do passado”, Ulpiano Bezzera de Meneses considera que:

“(...) o que se costuma ver como critério maior para a identificação a priori de um objeto histórico é sua vinculação biográfica ou temática a um feito ou figura excepcionais do passado, normalmente heróis vencedores ou, quando vencidos, considerados moralmente superiores(...)” (MENESES, 1992, p. 4)

Levando em consideração essa interpretação, podemos nos remeter à narrativa do guia, que exalta os pertences de Ludovico, o “vencedor”, que retirou a capital da Cidade de Goiás, que era reduto político de seus opositores, Os Caiado, e embora não tenhamos trazido a narrativa integral do guia, vale registrar que ela constantemente aponta os Caiado como forte grupo político local e faz questão de falar da atuação política da família, juntamente com os Bulhões. As histórias biográficas estão presentes, sem dúvida.

A cidade de Goiás como um grande museu a “céu aberto”, carrega a imagem de cidade histórica, e tudo na cidade, ou pelo menos no centro histórico, nos conduz a essa interpretação da cidade. Tem-se dificuldade inclusive, de entender que todo espaço é histórico, ainda que seja um espaço moderno. Esse debate realizado em sala de aula durante a disciplina de história de Goiás, foi bastante significativo, pois o curso conta com discentes de todos os cursos da UFG, e nos diálogos de sala de aula, o que mais nos chamou a atenção, foi a carência de história, o espanto e o entusiasmo das pessoas, sedentas por discutir a história de Goiás. Nós professores pesquisadores, que tratamos de investigar sobre o tema, damos cursos, realizamos projetos e buscamos compartilhar o que produzimos, muitas vezes não temos noção do tamanho do trajeto que temos de continuar a percorrer. Veja a narrativa de um discente do curso de veterinária:

“O fato da história de Goiás não ser estudada profundamente nem mesmo nas escolas goianas nos dá a impressão que pouco se sabe sobre o estado, porém com a visita ao Palácio Conde dos Arcos foi possível perceber a quantidade de informações a respeito da origem tanto da Cidade de Goiás quanto do estado de Goiás que poderiam ser mais exploradas pela população goiana.” (Alunx da disciplina de história de Goiás, 2/12/2017)

A interpretação de uma aluna do curso de pedagogia, nos convida a pensar exatamente sobre o que trouxemos parágrafos atrás. Ela registrou sua interpretação sobre os bens materiais expostos no museu, sem deixar passar a intervenção sofrida no espaço, com mobílias novas e os espaços reformados, como os banheiros. Ocorre que todo ano, no mês de julho, em comemoração ao aniversário da antiga capital, a capital é simbolicamente transferida para Goiás, e o atual governador, Marcone Perillo, não por acaso, fecha o Palácio e se hospeda no local, apropriando-se desse “poder historicamente constituído”. Enfim, a aluna também registra seu incômodo com algumas falas do guia, o que de fato, sabemos, pode ocorrer em vários espaços de visitação, a exemplo do pequeno museu que citamos momentos atrás.

“No dia 02 de dezembro de 2017, visitamos o museu chamado Palácio Conde dos Arcos com a turma da disciplina de núcleo livre e a professora Cristina e fomos guiados pelo historiador (...). O que marca nesta visita é a estrutura da residência, os moveis de acordo com a época, apesar de terem modificações tanto na estrutura como no caso do banheiro quanto na mobilía com moveis da era atual. Além disso o que não podemos deixar de comentar é sobre o guia, que não permitiu que ficássemos a vontade durante a visita, além de se apropriar de falas preconceituosa e política durante a exposição. Houve diversas brincadeiras desnecessárias durante a visita. Esse combo de atitudes acaba por desestimular a visita ao museu.” (Alunx da disciplina de história de Goiás, 2/12/2017)

Para finalizar, registramos a narrativa de um turista vindo de São Paulo: “O assunto que mais me chamou a atenção foi a história da cidade em si. O lado político, o lado de ser capital e depois mudar, sair pra outro lugar”. (Visitante turista, dezembro de 2004)

Vê-se que as controvérsias políticas que estão na narrativa do guia chamaram a atenção do turista. Na visitação de fato essa disputa política intensificada com a transferência da capital é evidente, sobretudo porque à época, os Caiado se vinculavam ao grupo chamado anti mudancistas, enquanto os Ludovico se vinculavam ao grupo mudancista, gerando uma luta política, na qual Ludovico criou a imagem do novo, com Goiânia, criando assim, a imagem de “cidade velha” para Goiás. A Cidade de Goiás, vulgarmente conhecida por “Goiás Velho”, ganhou esse nome em função do discurso político criado à época, quando Goiás se tornou “velha” para que Goiânia, a “nova” e planejada cidade fosse considerada moderna. Isso se reflete na narrativa do guia e acaba por contribuir com uma concepção de história para aqueles que o visitam, seja para indagar ou se identificar.

O que sentimos necessidade de pontuar, para não concluir, é que na visitação ao museu somos espectadores, que escutamos, ao mesmo tempo em que somos atores, que interpretamos, reinterpretamos, absorvemos ou simplesmente criticamos ou negamos. Na fala do guia não é diferente. Sua narrativa é carregada da história oficial, mas também da impressão de um morador da cidade, consumido pela imagem de cidade histórica que carrega Goiás. Ele se posiciona, mas também “dialoga” com os visitantes, no enfrentamento ou na identificação com eles.

Enfim, nessas poucas considerações que trouxemos aqui, o que fica é a importância dessa reflexão e como temos o poder de reinterpretar o passado conforme nossos anseios do presente, e que criar ou recriar a história nos espaços do museu pode servir tanto para reforçar a história das elites, como para a construção da resistência, conceito tão necessário em tempos difíceis como os que estamos vivendo no Brasil. Está aí, nosso papel como educadores!


Referências
Cristina Helou Gomide é Prof.Ad.na Universidade Federal de Goiás

BITTENCOURT, Circe. As “Tradições Nacionais” e o ritual das festas cívicas. In: O Ensino de História e a criação do fato. Contexto: SP, 1988, p. 43 a 72.

FENELON, Déa Ribeiro. São Paulo: patrimônio histórico cultural e referências culturais. In REVISTA Projeto História. São Paulo: EDUC (18), maio 1999.

GOMIDE, Cristina Helou. Vazio e Dor, patrimônio e Revanche: algumas considerações sobre a história urbana a partir de narrativas orais. In CADERNOS CERU (CENTRO DE ESTUDOS RURAIS E URBANOS) FFLCH/USP, n. 16, 2005, p.93-104.

LIMA e FONSECA, Thais Nívia. Cap. III: Exaltar a pátria ou formar o cidadão. In: História e Ensino de História. Autentica: BH, 2. ed., 2004, p. 37 à 71.

MENESES, Ulpiano T. Bezerra de para que serve um museu histórico? In REVISTA do Museu Paulista. Como Explorar um Museu Histórico. São Paulo: USP, 1992.

RIBEIRO, Miriam Bianca Amaral. História, Família e Poder . CHAUL, Nasr Fayad (org).  Coronelismo em Goiás – estudos de caso e família. Goiânia: CEGRAF, 1999.

LIMA e FONSECA, Thais Nívia. Cap. III: Exaltar a pátria ou formar o cidadão. In: História e Ensino de História. Autentica: BH, 2. ed., 2004, p. 37 à 71.

44 comentários:

  1. Professora Cristina Helou, considerando a sobrevivencia de uma visita contemplativa, que tende a reafirmar o discurso oficial da história regional e do poder deste discurso em se reeditar diante de seguidas gerações, como pensar a visita como momento e parte do processo de produção do conhecimento capaz de tornar a visita um procedimento critico?

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  2. Na disciplina de "História de Goiás", mesmo após um mês de aula sobre a transferência da Capital da Cidade de Goiás para Goiânia, grande parte dos alunos que visitaram o Museu Antigo Palácio Conde dos Arcos ao término do semestre, se envolveram com a fala do guia. No entanto, entendo que nós carregamos uma formação densa, que vem caminhando historicamente para o reforço dessa história da elite. nem o guia, nem os alunos são motivo de crítica. O que nos interessou e pareceu de fato muito importante, foi que os alunos impactam e são impactados, entram no museu para uma visita guiada e se colocam em jogo, num jugo que é como um vai e vem, onde são espectadores e atores e justamente por isso, interpretam o museu, e muitas vezes o fazem mesmo queando não se reconhecem no espaço visitado. Mesmo assim, cabe a nós, como pesquisadores e professores de história, questionarmos espaços com exposições construídas para esse reforço, onde a história e feita por alguns e outros são excluídos, tornando-se apenas aquele que contempla. O conformismo é fruto de propaganda, e o museu, quando é a representação dessa elite, serve como mecanismo de reformo a essa lógica. Assim,insistimos na sala de aula, nos textos produzidos - que precisam se restringir menos às publicações acadêmicas, e ganharem espaço no cotidiano das pessoas - nos debates cotidianos. É fundamental beber do desejo de um aluno, que quando vai ao museu sente como não sabemos nada sobre história de Goiás. Esse desejo abre espaço cada vez mais para desconstruirmos o discurso do conformismo, sobretudo porque nessa desconstrução, aquele que é estimulado a contemplar, v~e a possibilidade da transformação quando ele próprio é parte da história. Não é uma tarefa fácil, quando os usos públicos da história tendem a reforçar a história das elites, sobretudo porque é dela que a grande mídia sobrevive...

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    1. para complementar, o que quero dizer é que o fato de não se reconhecer torna-se um ato político, de transgressão. Afinal, mesmo as chamadas exposições chamadas "permanetes", não são fixas, pois a própria visita, o olhar do "outro", lhe atribui movimento e significado.

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  3. Professora Cristina Helou,
    Como você percebe os museus da Cidade de Goiás, eles são espaços de memórias ou lugares de história?

    Max Lanio Martins Pina

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    1. Bom dia, Max.
      Temos alguns museus na Cidade de Goiás. O Museu das Bandeiras, por exemplo, é local onde podemos encontrar muitas fontes históricas. Nele, remonta-se muito da trajetória histórica do local.
      O caso do Museu Conde dos Arcos nos parece diferente. O museu carrega uma memória de tempos anteriores à transferência da Capital, bem como sobre a própria transferência, que alimenta uma concepção de história oficial. Nesse sentido, entendo-o como lugar que abarca uma memória que reforça um tipo de história na qual alguns sujeitos se vêm e outros não. É uma proposta possível de se ver quando observamos a seleção dos bens presentes na exposição.
      A casa de Cora Coralina, sobretudo após a última reforma, preocupa-se em apresentar a biografia da escritora, portanto, vejo-o como lugar da história. A Cidade de Goiás, por ser concebida como "Cidade histórica" (embora toda cidade seja histórica), carrega a imagem como local da história, mas temos uma história que se constitui com base em algumas memórias. Realizei várias entrevistas com moradores locais desde a década de 1990, o que torna essa discussão bastante extensa.
      Espero ter respondido sua questão.
      Abraço
      Cristina Helou Gomide

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  5. Professora Cristina,
    Nas cidades pequenas onde há museus, temos a predominância de lugares que contam apenas com a "história oficial", em que se privilegiam os "pioneiros", homens e mulheres de famílias tradicionais com alguma importância no desenvolvimento da cidade, mas se ignora os outros moradores, que por não possuírem um "sobrenome de peso", são excluídos da história. Em sua opinião, como um(a) professor(a) pode trabalhar a história local, com o uso do museu, sem deixar que seus alunos e seus familiares se sintam preteridos da história?

    Att.
    Pedro Henrique Caires de Almeida

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  6. Bom dia, Pedro Caires.
    Realmente isso é muito comum em pequenas cidades.Sempre que viajo faço questão de conhecer os museus locais, e o que nós comumente escutamos é "essa é a maquina de escrever do fulano", ou, "este é o cachimbo usado por fulano todos os dias antes de dormir", dentre outras coisas. Com certeza, tanto a seleção dos bens expostos, como a abordagem, reforçam uma história com a qual poucos se identificarão, estimulando uma noção de história em que somos apenas os que contemplamos.
    Esse tipo de museu, no entanto, não está somente nas pequenas cidades. Em Goiânia, cidade planejada, construída para ser capital de Goiás, no lugar da Cidade de Goiás, teve como protagonista "Pedro Ludovico Teixeira", citado nesse modelo de história como "O construtor de Goiânia, um homem à frente de seu tempo". Uma história construída, assim, como outros heróis da nossa história. Sua casa, tornada museu, "O Museu Pedro Ludovico Teixeira", possui seus bens e de sua esposa. Na visita guiada com os alunos - com os quais já discuti a história regional - os guias normalmente recorrem à história oficial. É comum que digam "essa é a lista telefônica que Pedro Ludovico usou"; "Esse é o banheiro azul dele e de dona Gercina"; "Essa é a máscara mortuária do meu avô"....lemrbando que essa última fala é porque de fato, o guia é o neto dele. Embora muitos alunos e alunas tenham um olhar crítico sobre a história em função do tempo que estudaram sobre o tema, fica muito desse modelo de história e isso acaba reforçando o não reconhecimento das pessoas com a história do lugar. Mesmo assim, o não reconhecimento pode ser um primeiro passo para pensarmos o que está exposto ali de forma que o visitante não veja apenas o objeto e a história do "outro". Não temos uma receita, mas o que temos feito, é mostrar que a própria arquitetura da casa é parte da história da cidade. Laçamos questões como: Essa é uma casa de quem veio para construir goiana? Os operários que construíram Goiânia também viviam em uma casa assim? Quantas pessoas possuíam telefone naquela época? Ou seja, buscamos mostrar que aquilo que está exposto não precisa se referir somente à história de uma só família. Aquela foi família foi "eleita" como referência, mas muitas outras existiram naquele mesmo momento, morando em casas similares ou em casas modestas em bairros distantes.
    Porém, essa não é uma tarefa fácil, já que trata-se de uma luta contra uma concepção de história posta curricularmente desde o século XIX, sobretudo com a criação das datas cívicas e os heróis nacionais. Desse modo, o processo de desconstrução e reconhecimento também não é abrupto e cabe a nós ir experimentando novas formas de identificação na história.
    Me lembro também de um curso que ministramos sobre patrimônio e educação. A abertura do curso começava com a solicitação que o pessoal levasse algo que eles tivesses guardado desde a infância, e que lhes fosse caro, especialmente carregado de sentimento de pertença. Era uma atividade muito interessante, porque depois, quando visitavam espaços abertos à visitação pública, tendiam a refletir sobre onde se viam e onde não.
    Enfim...a agústia é de todos, mas temos tentado encontrar novos caminhos.
    Cordialmente,
    Cristina Helou Gomide

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  7. Olá professora,
    Parabéns pelo texto. A respeito da interface entre museu e educação, você já teve alguma experiência com a utilização dos museus virtuais em sala de aula? Qual a sua opinião sobre a utilização desse recurso.
    Abraço e bom debate.

    Israel da Silva Aquino

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  8. Cristina Helou10 de abril de 2018 14:36

    Olá Israel.
    Boa noite.
    Infelizmente não tive a oportunidade de realizar esse tipo de trabalho, mas considero fundamental que consideremos os museus virtuais, pois são formas democráticas de garantir o percurso de alunos e alunas, tornando-se uma forma rica de produção do conhecimento. O mesmo podemos dizer dos arquivos virtuais, carregados de fontes de pesquisas. Quando disponível para toda a comunidade, a tecnologia se torna instrumento significativo de debate e cidadania.
    Abraço!
    Cristina Helou Gomide

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  10. Olá,boa noite!
    Estou refletindo sobre museu em movimento,entretanto vejo a dificuldade de os menos favorecidos visitarem museus, nessa perspectiva como na sua opinião professora apresenta-los para essa nova leitura de museu?
    Os poucos que visitam museus ainda estão com ideia de fossilizado, e penso que levar meus alunos num museu moderno será difícil, pois objetos contemporâneos não será atraentes para os mesmo, uma vez que esses objetos estão a nossa disposição, sendo assim não vejo o museu fossilizado como um lugar de exclusão de nossa geração.
    Como a senhora poderia me auxiliar,na clareza de sua opinião?
    Agora para os que já estão habituados a frequentar museus, é um olhar inovador, favorável e promissor.
    Atenciosamente.
    EDnéia Matos dos Santos.

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    1. Oi Edneia. Bom dia.
      Bom...penso que a visita ao museu não tem muita relação com a classe, pois o problema, ao meu ver, está na nossa concepção de história, na qual o museu é posto como local de contemplação, e, portanto, de conformismo. Essa perspectiva de história atinge qualquer um, independente de classe. É parte da nossa formação, oriunda de um currículo que privilegiou alguns "escolhidos", e com eles, algumas datas consideradas cívicas.
      Outro aspecto da sua questão, é que não vejo o museu como "fossializado". Pelo contrário, o vejo em movimento, pois toda vez que realizamos o percurso em uma exposição atribuímos olhar a ela. Não somos tão passivos, podemos ou não nos reconhecermo-nos no museu. O que você denomina de fossializado, talvez se refira à concepção elitista de história, esta sim, é parte da minha crítica, já que nesse tipo de museu a tendência à não identificação do visitante com o que está exposto é maior.
      O museu é um espaço importante, formativo. Ainda que o museu expresse a história da elite, é local de desconstrução também. Cabe a nós, antes e depois da visita ao museu, realizar o debate sobre o modo que as coisas foram postas, e que tipo de história está ali. É bom que questionemos os alunos, perguntando onde se reconheceram e onde não. Esse é um processo, e como todo processo não se dá da noite para o dia. No ato da insistência estamos produzindo conhecimento sobre o já produzido, questionando algumas concepções postas para nós cotidianamente, desde a criação do nosso currículo de história no Brasil.
      Desse modo, mesmo que não exista o hábito de visita ao museu, ainda assim a interpretação pode acontecer, ainda que seja negando-o.
      Abraço
      Cristina Helou Gomide

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  11. Oi Cristina (Cris!), minha querida e eterna professora de História, boa noite!

    Que feliz fiquei em ler seu texto e saber que atualmente conversamos mais de perto do que eu imaginava. Na minha pesquisa de mestrado, que não foi na história, analisei e etnografei um grupo de folia de Reis também da Cidade de Goiás. Eu refleti sobre a ideia do patrimônio cultural ser também performance, sendo este o campo do conhecimento em que realizei a pesquisa sobre a dança da catira. Porém, por mais que não tenha abordado diretamente os museus, e sim o chamado “patrimônio imaterial/intangível”, vejo uma grande aproximação entre nossas considerações, principalmente em relação ao conceito de resistência como sendo conclusivo em nossas pesquisas e, também concordo, o nosso papel como educadoras.
    Agora, atuando no Cepae/UFG também tive a oportunidade de desenvolver um projeto com patrimônio, em Pirenópolis, mas ainda não levei nenhuma turma a museus. Gostaria. Sobretudo ao somar-se todo o universo escolar e questões do ensino de História, que você abordou tão bem em seu texto. Não deixo de me questionar, desde então, como, enquanto professora de História, poderia contribuir com minha própria pesquisa para tentar encontrar algumas repostas a essas questões? Em outras palavras, em que medida o ensino de História poderia dialogar com essas manifestações “vivas” do patrimônio que, muitas vezes, compreendem justamente os discursos de resistência?
    Neste sentido tomo a liberdade de reproduzir, neste comentário, parte do meu texto, na intenção de aprofundar a discussão e receber novamente um pouco da sua perspicácia e conhecimento.

    “Tanto quanto a catira, também o patrimônio é performance, pois constitui-se de um conjunto de práticas comunicativas (WEST; BOWMAN, 2010, p. 278). Não obstante a ampla abrangência do conceito de performance [metodologia da pesquisa, portanto bastante analisada], é exatamente por isso que ele oferece instrumentos metodológicos para se pensar o patrimônio em sua variedade e natureza conflitante. A performance permite que seus produtores transgridam o que foi sancionado pelo discurso oficial, construindo seu próprio sentido de patrimônio. Assim, não importa para os foliões e catireiros de Goiás que sua tradição não seja visibilizada pelo discurso autorizado do patrimônio. Mesmo ao discurso do Museu das Bandeiras não interessa que a catira, considerada pela literatura folclórica como um dos principais instrumentos de colonização e conversão dos indígenas ao catolicismo , faça parte de sua exposição acerca da ocupação do território minerador do interior do Brasil, por exemplo. Por outro lado, as Companhias de Reis parecem vivenciar um espaço que não a cidade patrimônio mundial, haja vista que o título encontra pouca ressonância (GONÇALVES, 2005) entre esses grupos. É sintomático que na folia da Cia. de Reis da Bandeira Vermelha o presépio montado pela prefeitura no Chafariz de Cauda não seja motivo para a parada e cantoria que é regra geral no caso de um presépio (lapinha) no interior de alguma residência e nos pousos. A cidade é vista pelos foliões a partir dos interiores das casas simples e da periferia. Também no espaço público, o cemitério se destaca com uma importância maior do que as inúmeras igrejas tombadas como patrimônios culturais pelos órgãos competentes. Para Canclini (1994, p. 97) “os produtos gerados pelas classes populares costumam ser mais representativos da história local e mais adequados às necessidades presentes dos grupos que as fabrica”. [...]

    Juliana Ribeiro Marra

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  12. Continuando...
    Assim, o patrimônio ocupa lugar central na antítese estabelecida entre o discurso universal e o particular, ou local. Como apresenta Canclini, os grupos produtores dos bens culturais de caráter popular tendem a se identificar mais com o contexto local ou regional de suas vidas cotidianas. O discurso que acessa a categoria do universal, seja através da instauração da equivalência entre o patrimônio e a identidade nacional, ou por meio da universalização da Unesco ao outorgar o título de patrimônio da humanidade à cidade de Goiás, é, no caso dos foliões e catireiros da cidade, sentido como algo muito distante, talvez com um significado quase inexistente. [...]
    Também para Laurajane Smith (2006), a literatura sobre o patrimônio o mantém como uma representação simbólica da identidade. O patrimônio material e tangível provê uma representação física daquelas coisas “do passado” que falam ao senso de lugar, de ser, de pertencimento e de comunidade. Para a autora, a emergência do discurso do patrimônio no contexto do nacionalismo do século XIX significa que a primeira forma de identidade frequentemente associada ao patrimônio é a nação. Contudo, soma-se a isso que os discursos nacionalizantes são reforçados pelas disciplinas especializadas no patrimônio – arqueologia e história – e na ênfase que é dada aos valores universais do patrimônio, sobretudo após a Convenção do Patrimônio Mundial. Smith analisa como essa ênfase faz com que outras formas de identidade sejam frequentemente obscurecidas e desvalorizadas. O discurso do patrimônio, na condição de senso de comunidade nacional, ignora a diversidade das culturas “sub-nacionais” e as experiências sociais. Assim, com a narrativa da nação, o discurso do patrimônio também explicita e promove a experiência e valores das classes sociais elitizadas (SMITH, 2006, p. 30).
    O discurso autorizado do patrimônio é delimitado então pelos especialistas, pessoas que estão “autorizadas a falar” sobre o passado. Sua atenção é focada nos valores estéticos e objetos materiais, lugares que devem ser protegidos, cuidados, conservados e ensinado às futuras gerações, com o objetivo de manter uma identidade comum baseada no passado. Isso pressupõe – e também constitui ponto de análise da autora – que o público que visita os espaços de memória e patrimônios oficiais os vivenciem de maneira passiva. Ora, encarar o público enquanto passivo, pressupõe um consumo acrítico da mensagem construída pelos especialistas do patrimônio (SMITH, 2006, p. 31). Para a autora, o próprio termo “visitante” deixa implícita essa ideia. Ela faz ainda uma análise elaborada dos fatores que derivam a noção de passividade dos “visitantes do patrimônio”. Porém, o que importa aqui é que o que está ausente no discurso autorizado do patrimônio é o senso de ação ou de perspectiva crítica da parte não especializada dos usuários do patrimônio. O discurso do patrimônio estabelece e sanciona uma relação hierárquica entre especialistas, patrimônio e “visitante”, na qual os especialistas “traduzem” o lugar e os seus significados aos visitantes (SMITH, 2006, p. 34). A consequência disso é o obscurecimento do trabalho da memória e performatividade que são característicos dos espaços patrimoniais."

    Juliana Ribeiro Marra

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  13. Conforme apresentei [na dissertação], as performances reproduzem o patrimônio em sua variedade, às vezes complementando o patrimônio oficial, noutras opondo-se a ele. São elas que constroem o sentido do patrimônio e, para Laurajane Smith (2006), não devemos considerar que a leitura que o público/visitantes/usuários fazem do patrimônio é sempre acrítica ou passiva. Para ela, o patrimônio só tem sentido quando se parte das práticas das pessoas, não podendo ser “ensinado” de outra maneira. Ainda que mais recentemente o discurso do patrimônio (oficial) venha se aproximando do senso de experiência e do que ele significa, incorporando também as identidades locais, as falas destoantes (subalternas) continuam sendo parte de sua natureza. O patrimônio é espaço de luta simbólica e material entre classes, grupos e etnias, e não parece se constituir de outra forma (CANCLINI, 2001; SMITH, 2006; TAMASO, 2005, 2007).
    Nestor Canclini (2001) ressalta como o patrimônio serve como recurso para produzir as diferenças entre os grupos sociais e a hegemonia dos grupos que detém acesso privilegiado à produção, circulação e transmissão dos bens culturais. Assim, esses setores dominantes definem não só os bens superiores e que devem ser preservados, “mas também dispõem dos meios econômicos e intelectuais, tempo de trabalho e de ócio, para imprimir a esses bens maior qualidade e refinamento” (CANCLINI, 2001, p. 97). Ele aponta que os produtos gerados pelas classes populares também podem alcançar alto grau de valor estético e criatividade, mas eles têm menores possibilidades de converter esses produtos em “patrimônio generalizado e amplamente reconhecido” (CANCLINI, 2001, p. 98), ou seja, em patrimônio oficial.”

    Peço desculpas pelo longo texto, Cris. E parabéns pela pesquisa e ensino, tão importantes para o desenvolvimento dos pressupostos metodológicos da disciplina histórica. Grata pela oportunidade de ler e refletir com você.

    Saudades! Grande abraço,

    Juliana Ribeiro Marra

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    1. Juliana (JU), querida!
      Que prazer, que delícia te encontrar aqui e ter a oportunidade de conhecer um pedacinho do seu trabalho. Sua discussão é fantástica e me fez lembrar de muitas coisas que compuseram o processo da minha pesquisa, que vem acontecendo e amadurecendo desde a década de 1990.
      Fiquei pensando em como Cora Coralina, seu trabalho, seus textos, foram reconhecidos pelo IPHAN nos primeiros tombamentos acorridos na cidade (SPHAN, à época). Claro, com todo o respeito e admiração à obra da autora, algo que não deixei de perceber foi que seus textos que referem-se à história de Goiás, grande parte, "reproduzem" uma história oficial, hoje revista por tantos historiadores. Outras coisas que me surgiram à mente, foram as entrevistas realizadas com algumas pessoas de "peso" no campo do patrimônio na cidade. Entrevistei uma senhora, de família tradicional, que me disse: "temos que ajudar essas pessoas, então estamos montando uma cooperativa". Ela se referia às doceiras da cidade. Logo naquele momento, o "aquelas pessoas" me remeteu exatamente ao que você vem colocando no seu trabalho. Como ela, outras tantas pessoas parecem encarregadas de uma história que dificulta que outros campos da cultura e portanto do patrimônio tenham mais visibilidade.
      Agora...pensando sobre práticas que não atingem o campo do reconhecimento, me veio o seguinte: se é transgressão, se é da comunidade e é expressivo para eles, pode não ser ruim que continue assim. Talvez o reconhecimento transforme a transgressão em padrão, esvaziando o valor antes edificado. É como quando o funk era resistência, mas apareceu no Faustão. Nesse momento, virou moda, esvaziando-se do seu sentido primeiro.
      Recordei também de quando entrevistei pessoas residentes em bairros distantes do centro histórico após a terrível enchente de 2001. Quando perguntados sobre como foi aquilo tudo para eles, muitas respostas foram: aquilo foi lá...aqui não teve nada não.
      Por outro lado, a resignificação da tradição também se tornou resistência, quando o monumento que mais sentiram perder, foi a Cruz do Anhanguera. No mesmo sentido que na década de 1990 o discurso dos moradores que permaneceram na Cidade de Goiás mesmo após a transferência da capital para Goiânia, era de mágoa, abandono, e de pesar porque diziam que a cidade havia ficado "parada". Afinal, o "pacato" foi parte do discusso que deu base à mudança da capital. Anos depois, já em 2007, entrevistando moradores e moradoras, o "pacato" passou a representá-los, em função da imagem de cidade histórica que vêm trazendo.
      Essa é uma discussão complexa, contraditória!
      Espero te ver em breve e trocar muitas ideias.
      Aprendi com seu texto! O conceito de "visita" "visitante" e a crítica a ele me fizeram questionar muito e com certeza me fazem agora repensar seu uso....
      Gratidão por compartilhar comigo, conosco.
      Beijo grade!
      Cristina Helou Gomide,
      Ex-professora e amiga.

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    2. Sim Cris, foi mesmo incrível nos encontrarmos nesse espaço. Sabia que nosso diálogo me deixaria algumas "pulguinhas atrás da orelha", que no fim é mesmo o que buscamos nesses debates né, mais e mais questões e reflexões.
      Obrigada pelas ponderações, também fiquei a pensar no caso de Cora Coralina, nunca tinha me ocorrido dessa forma.
      Sobre o reconhecimento dos bens culturais, concordo absolutamente que a problemática é por demais complexa e contraditória. Na pesquisa que apresentei a você, analisei dois grupos muito diferentes entre si, embora ambos fossem grupos de catira. Um é o citado grupo de Goiás, mais tradicional, com uma história mais antiga e muito ligado à religiosidade. O outro é um grupo feminino, recente, formado por jovens do município de Itaguari, a 50km de Goiás. Ambos são grupos de catira, quanto a isso não há divergência, a questão é que o primeiro traz a marca da tradição, da conservação e o segundo, a inovação, a originalidade, mas também a espetacularização. Quero dizer que compreendo a questão da resistência, de se opor à ideia de padronização, mas, ao mesmo tempo, como negar a essas pessoas o desejo de ter acesso aos (supostos) benefícios do reconhecimento? Isso porque predomina a noção vigente de que os bens reconhecidos recebem aportes e recursos que permitem uma boa gestão de seus espaços ou criações, como no caso da Procissão do Fogaréu. Enfim, é mesmo uma situação ambígua, que parece estar longe de ter uma solução fácil.
      Também me ajudou muito pensar a questão da ressignificação da tradição enquanto resistêcia. Conclusão, resistir, sempre!

      Eu também estou ansiosa para encontrá-la e trocarmos muitas figurinhas. Assim que conseguir dar uma "respirada" vou mesmo te procurar. Ah, e por favor, se no próximo semestre você for ministrar a disciplina História de Goiás, me comunique, adoraria poder participar.

      Grande beijo e até breve,
      Juliana Ribeiro Marra

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    3. Oi Ju.
      Pois é...esse debate gera um monte de ideas e perguntas.
      Pensando sobre o que você apresentou, fiquei pensando. Eu concordo. No doutorado me meti a criar uma categoria, que chamei "tradição alternativa", rsrs, que com base na leitura do Raymond Williams me fez pensar na reafirmação dos monumentos como algo alternativo, e não necessariamente "oficial". Talvez, ainda que num contexto diverso, o reconhecimento possa se encontrar a partir dessa reflexão...
      Quando tiver a disciplina te falo.
      Beijão
      Cristina Helou Gomide

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  14. Profa. Cristina,

    Primeiramente, gostaria de parabenizá-la por sua conferência, relacionar as comparações de percepções do público visitante me levaram a muitas reflexões. É interessante verificar as leituras e identificações que a visita a um museu pode promover, bem como o processo de valorização de quem não conhecia a história da própria cidade. Um dos pontos mais tocantes de sua conferência é a questão sobre reinterpretar o museu a cada visita, a apuração do olhar, as sensibilidades sempre nos levam a novos insights.

    Tenho uma admiração pelas questões de patrimônio e museológicas, e principalmente dos atores que fazem a história continuar a respirar ali naquele espaço, tido muitas vezes como algo muito estigmatizado, “velho”, sem graça”.

    Eu penso que os museus podem ser uma aula de campo especial para os estudantes tanto como forma de percepção identitária, valorização da história local quanto uma forma de visualizar melhor aspectos culturais. Minha proposta é que museus e escolas podem e devem trabalhar juntos. Tanto que nessa minha empolgação tentei contribuir com o tema analisando uma experiência do Museu Regional dos Inhamuns, no interior do Ceará.

    Tenho uma comunicação aqui no simpósio, na parte de “Mídias, fontes e temas transversais”, cujo título é “A História Oral como ferramenta de produção identitária: quando o museu invade a escola”. Falo de uma experiência muito válida dessa relação entre os dois agentes (escola e museu) e a participação dos estudantes através de pesquisas por meio da História Oral e do acolhimento de Histórias de Vidas de personalidades locais, das mais diversas camadas sociais.

    Será que não é hora dos museus abrirem suas portas para as histórias não oficiais? Buscarem ações pra dinamizar o acervo? Buscar o público onde ele está? Promover exposições itinerantes envolvendo as comunidades ? Será que este é o momento da Academia e das escolas participarem desse processo de construção do conhecimento?

    Cordialmente,

    Luiza Helena Amorim Coelho Cavalcante, estudante de História e Jornalista

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    1. Olá, Luíza Helena. Vou buscar por seu trabalho aqui. Tenho trabalhado bastante com história oral nos últimos 20 anos, em específico, com histórias de vida. Me interessou demais.
      Com certeza é hora dos museus abrirem suas portas para as histórias de outros sujeitos. Penso, inclusive, que muitas vezes, o não reconhecimento das pessoas após a realização do trajeto se dá exatamente porque eles não podem se ver no local que não é coletivo, que expressa uma história unilateral. Esse conceito de patrimônio, tal qual conhecemos, como algo que alguns elegem elementos mais ou menos importantes, não nos coloca na história. A ida a um museu oficial, ao meu ver, é importante para que façamos a leitura daquilo que está posto. Nesse sentido, partindo do que se vê, do que a gente se identifica ou não, a criação de exposições que não se refiram à oficialidade se tornam ainda mais importantes.
      Sem dúvida, passou da hora da escola dialogar com os museus e vice-versa. Infelizmente, por longo tempo, as idas a museus se davam como passeios sem fundamentação. lembro da minha infância. Todo ano a escola nos levava ao mesmo museu, e o que mudava no nosso cotidiano era o lanche que levávamos de casa. Talvez por isso tenha me empenhado tanto nesse discussão. Nossas idas eram estranhas, descontextualizadas, e os bonecos de cera, replicando os índios de Goiás nos davam medo. Era tudo muito distante, mesmo que tudo isso faça parte da nossa história.
      Questionar o que é público é fundamental para produzirmos conhecimento. Por que algumas coisas são mais "pública" do que outras? Por que os monumentos são erguidos para uns e não para outros. Lancemos a questão: Por que não eu? por que só "ele"?
      Desconstruir o museu como o lugar do passado distante é fundamental. Recentemente coletei o depoimento de alunos e alunas da universidade após a ida ao Museu Antropológico da UFG. Como é um museu universitário, é carregado das reflexões realizadas por nós. Muito interessante foi ver o olhar dos alunos para vestígios humanas de 7.500 anos atrás...mas eles não viram como algo distante ou velho. Viram como algo novo, interessante. Todo trajeto do museu foi de identificação, então, sem dúvida esse trabalho é necessário, inclusive porque nossa identidade conduz a uma noção de cidadania que não seja conformista, e sim, transformadora.
      Abração!
      Cristina Helou Gomide

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  15. Olá, professora!
    Primeiramente, parabéns pelo texto!

    O questionamento sobre estruturas e discursos se faz importante, porém, como tornar um acervo "auto-questionante", que por si, mesmo que sem a presença de um guia, mostre pontos de reflexão sobre sua própria natureza? Através de textos? Vídeos? Mudando a disposição do acervo?
    Peço para que, mesmo eu não conhecendo o museu fonte para o texto, a resposta abarque exemplos de ações que poderiam ser feitas no Museu do Antigo Palácio Conde dos Arcos.
    Também quero deixar claro que não menosprezo a presença de um guia, pelo contrário, acho extremamente pertinente, estou apenas querendo trazer um outro debate aproveitando o ensejo do tema.

    Agradeço a atenção,
    Pedro Ernesto Miranda Rampazo

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    1. Boa tarde, Pedro Ernesto!
      Muito bacana sua questão!
      Quando vivia em São Paulo, lembro de ir a uma exposição sobre "Sentidos". Não havia guia e a ideia era exatamente a nossa experimentação. Nós deveríamos sentir o que estava posto. À época, fiquei extremamente impactada. Vivenciei cada proposta, cada pedaço...e como havia acabado de almoçar, até meu corpo sentiu as náuseas, parte da proposta dos sentidos. Era uma exposição que continha muito de tecnológico assim como de objetos artesanais. Como essa, várias outras exposições podem proporcionar experiências intensas.
      No caso de um museu de história, penso que isso poderia sr feito, com certeza!
      Se eu tivesse a oportunidade de propor uma ação "auto-questionante" - como vooê denominou - no Museu Conde dos Arcos, proporia que o museu tivesse duas entradas: uma que nos colocasse para experimentar um pouco do cotidiano de moradores "comuns" da cidade ao longo da história; de outro, o cotidiano de governantes que ali viveram e receberam pessoas, tais como "fidalgos", como afirma o guia. Sobre a segunda, os alunos inclusive já chamaram a atenção quando fizeram o trajeto comigo, ressaltando seus incômodos com o destaque para o ambiente luxuoso e tão distante da realidade do povo.
      Como o Conde dos Arcos remete-se sobretudo ao processo histórico de Transferência da Capital da Cidade de Goiás para Goiânia, proporia também dois trajetos: um que nos colocasse com o antimudancistas (que eram contra a transferência da capital, moradores, políticos...); e de outro, os mudancista (políticos que defendiam a mudança da capital para outro local). certamente, fontes impressas, vídeos com depoimentos, fotografias, comporiam as duas exposições. Nesses casos propostos, tanto um lado como outro desembocariam na praça do coreto, espaço comum da cidade e pertencente a todos indistintamente.
      Se o museu precisasse manter todos os seus objetos postos ali, proporia a reconfiguração dos espaços, no sentido de colocar quadros explicativos, explicitando, por exemplo, sobre a sala de jantar, sobre hábitos da época, modos de ser e viver daqueles que ali estavam e também de outras famílias com o mesmo status. Não abriria mão de vídeos, já que tenho trabalhado há tempos com histórias de vida.
      Sua pergunta foi instigante.
      Espero ter respondido.
      Cordialmente,
      Cristina Helou Gomide

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  16. Boa Noite Professora Cristina. O que a senhora pode dizer sobre formas de tornar o museu um aliado no ensino de história local para os anos iniciais?
    Obrigada pela atenção,
    Olga Suely Teixeira

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    1. Boa tarde, Olga Suely.
      Os trabalhos de parceria, de diálogo, meus e ensino são fundamentais para a formação dos alunos e alunas. Os museus, para além das salas de aula, tornam-se espaços do novo, das novas possibilidades. As séries iniciais do ensino fundamental constituem-se em momento significativo da produção do conhecimento. Nesse momento, as primeiras experiências são marcantes, nos colocam no mundo. Assim, o bom trabalho em sala de aula, que refira-se à história local, pode conduzir ás múltiplas interpretações dos alunos e alunas. Mesmo que o museu se refira à história de uma família "eleita" para representar a história local, o trabalho prévio com a história regional vai colocar os alunos e "jogo", não somente como espectadores, mas também como atores, resignificando e dando movimento à história estancada.
      É importante também que o debate posterior aconteça, e que a gente pergunte para todos e todas o que eles acrescentariam ali. Assim, o museu se torna participativo, mesmo que eles não estejam representados naquele espaço.
      Enfim, não há um receita pronta, o interessante é experimentar ações, de modo a colocá-los a produzir história à partir do que está posto, ainda que aquilo parece imóvel e inquestionável.
      Cordialmente,
      Cristina Helou Gomide

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  17. Boa noite, professora Cristina Gomide!

    Tive a oportunidade de acompanhar como ouvinte uma visitação de discentes de escola pública, anos finais do ensino fundamental, a um importante museu de Natal (O Museu Câmara Cascudo). Observei que eles e elas ficaram muito entusiasmados e entusiasmadas com as expressões visuais disponibilizadas, mais especificamente com uma marcante exposição fotográfica sobre o sistema prisional da cidade e uma exibição de curto vídeo documentário sobre o cotidiano de vida e contribuições de um artesão potiguar. O que eu gostaria que a senhora discorresse um pouco mais seria sobre as possibilidades das contribuições das produções audiovisuais nesses espaços museais, na perspectiva de que eles deixem de ser vistos apenas como lugares contemplativos.

    RINELTON GIORDANIO FERNANDES

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    1. Boa tarde Rinelton.
      Anos atrás, conheci o museu Câmara Cascudo. Local instigante.
      Certamente, as imagens são sedutoras. Acho que nunca tivemos momento em que as fontes imagéticas foram tão sedutoras. Com o devido respeito às grandes pinturas, eram dificilmente democráticas. Os veículos de comunicação, as possibilidades que a tecnologia oferece, desde o advendo da fotografia, televisão, aos vídeos de celulares, as imagens começaram a se tornar instrumento de fascínio. Nesse sentido, as imagens podem falar e existem muitas formas de fazer isso. os vídeos, sem dúvida são fundamentais, seja o documentário, um filme ficcional com base em pesquisa histórica, ou até um vídeo feito com fotografias...
      Dependemos, no entanto, da proposta que a exposição carrega. Se a proposta é de reproduzir uma concepção de história dos "grandes", o vídeo que seduz continuará reproduzindo uma noção de história que não nos coloca como sujeitos do nosso próprio processo.
      No museu Antropológico da UFG, museu universitário em Goiânia,a exposição é dividida em duas partes. A primeira, Lavras; a segunda, Louvores. Na primeira, iniciamos a trajetória com vestígios dos primeiros habitantes de Goiás, há 7.500 anos, e termina com um vídeo documentário-curta sobre a confecção das bonecas Karajá. É muito bacana, pois apresenta a produção da boneca como parte da educação das crianças indígenas, o que marca bastante aquele que vê. Mas o que sempre me chama a atenção juntos aos alunos e alunas, é o final da exposição "Louvores". A última sala é em formato quadrado, com suas paredes em espelhos, mescladas com algumas imagens de homens, mulheres, crianças indígenas ou não. A proposta é que a gente se olhe no espelho junto a essas imagens. Nesse processo, nossa imagem se mistura ao rosto do outro e você deixa de se ver, e vê a imagem de outrem. Ou seja, é experiência, você de fato vivencia.
      Desse modo, penso que as imagens são importante instrumento de diálogo, de troca, de múltiplas possibilidades de reconhecimento, transformação e produção do conhecimento, onde pode-se romper com a mera contemplação...
      Cristina Helou Gomide

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  18. Este comentário foi removido pelo autor.

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  19. Bom dia, professora!
    Primeiramente queria parabenizá-la pelo texto.
    Pois bem, baseando-se num conceito de museu que, na maioria das vezes, expõe um história positivista com a exaltação da história dos ''grandes'', a senhora acha que trabalhar em cima desses museus com uma turma mais nova e assim, tendo sua primeira impressão sobre esses lugares, acaba influenciando eles a terem essa visão elitista da história, onde o que importa é a história vista de cima e não a de todos? Obrigada desde já.

    Ana Laura Daipré

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  20. Oi Ana Laura!
    Um pouco atrás estava respondendo à Olga Suely sobre museu e ensino de história nas séries iniciais.
    O que eu dizia era que o trabalho antes da ida ao museu é fundamental. Conhecer o local e conteúdo de história com o qual os alunos vão dialogar é importante. É importante proporcionar uma abordagem menos oficial da história, sobretudo no caso do museu representar essa história "vista de cima". No momento da "visita", no ato de interpretação do estão vendo, alunos e alunas vão se lembrar de algumas coisas, de outras não, e vão reinterpretar o que está exposto. Mas o que considero mais importante é que aluno seja perguntado sobre o que ele acrescentaria ao museu. O que está faltando? Ele vai, a partir daí, compôr a exposição como sujeito, como participante de um processo histórico que busca conformá-lo.
    Cordialmente,
    Cristina Helou Gomide

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  21. NESSE CONTEXTO, PERCEBEMOS O PAPEL DO GUIA NA CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA LOCAL COM UMA VISÃO OFICIAL / POLITICA NA QUAL CARACTERIZA OS ELEMENTOS PERTENCENTES NA ÉPOCA DE UMA MANEIRA PEJORATIVA OU POLEMICA NA VISÃO DOS VISITANTES, NO QUESITO, CONSTRUÇÃO DA MEMÓRIA COLETIVA QUAL O PAPEL DA MEMÓRIA INDIVIDUAL NO ENSINO APRENDIZAGEM DO CONHECIMENTO HISTÓRICO?

    ATT,

    JÁYSON FELLYPE RIBEIRO PRADO

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    1. Boa tarde, Jáyson.
      Considero as narrativas dos viajantes importante fonte histórica. Se a fala do guia está carregada dessa narrativa, seria interessante ir direto à fonte, levá-la para a sala de aula e trabalhá-la como tal, a fim de interpretá-la, desconstruindo a noção de verdade que comumente é apresentada em museus dessa natureza. Assim poderemos problematizar os usos desse discurso para construção de uma história pública-coletiva.
      Em comentários anteriores abordei outras questões que podem ser pensadas em museus cuja perspectiva é essa.
      Com relação a memória coletiva e a memória individual, o que posso dizer é que não existe memória individual sem coletiva e vice versa. No entanto, a interpretação atribuída aos espaços de visitação, ainda que pareçam ter absorvido o "oficial", não podem ser menosprezadas. O ato de colocar-se em jogo, como ator e espectador transforma não somente o sujeito que visita como também aquele que é visitado, garantindo movimento aos espaços de proposta histórica.
      Atenciosamente,
      Cristina Helou Gomide

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  22. De que forma o museu acrescenta na educação brasileira?
    Att;
    Vanderlania Ferreira Maciel

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    1. Olá Vanderlania.
      Os museus, em tese, são espaços destinados a expor o que temos produzido ao longo do tempo. Desse modo, a ida ao museu sempre acrescenta, ainda que seja para questioná-lo.
      Cordialmente,
      Cristina Helou Gomide

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  23. Professora Cristina Helou, boa noite:
    Em primeiro lugar gostaria de parabenizá-la pelo texto e agradecer por compartilhar suas ideias - lidas não apenas no texto da conferência, mas, também, nas respostas aos comentários - e parte de suas experiências no trabalho com museus, elas instigaram-me a querer conhecer o museu Antropológico da UFG.
    Acredito que o referido museu seja o resultado de um trabalho exitoso no qual as narrativas construídas para as visitações propiciam a interação entre aquilo que se narra e o público, numa interação potencializadora do diálogo entre o " eu" e o "outro". Nesse sentido, minha curiosidade é a de saber se, como formadora de profissionais em História, a senhora tem observado qual/is mudanças esses egressos têm conseguido conduzir em seus espaços de atuação, sejam eles o do ensino ou dos espaços museológicos? E, em caso afirmativo, quais impactos podem ser notabilizados? Há outros museus, ao estilo do Antropológico, fora do espaço acadêmico, que, pode-se dizer, sejam oriundos de sua experiência profissional desenvolvida com os estudantes?

    Reitero meus parabéns, gostei muitíssimo.

    Maria Sandra da Gama.

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    1. Boa tarde Maria Sandra.
      Que bom que gostou e que a leitura te gerou questionamentos!
      Sou professora da faculdade de Educação, formando pessoas no campo da licenciatura, especificamente Ciências Humanas.
      Algumas alunas do curso de pedagogia trabalharam como bolsistas no Museu Antropológico. Todas foram minhas alunas. Duas delas, orientandas de monografia de final de curso de graduação. A última produziu um trabalho belíssimo sobre visitação de escolas ao espaço do museu. As bolsistas ficaram especialmente tocadas e envolvidas com o local. Sobre as turmas que conduzo ao museu, alguns alunos têm partilhado comigo, quando já professores em sala de aula, experiências de visita não somente ao Museu Antropológico, como também a outros espaços de visitação pública. Geralmente, esses alunos não esquecem desse trabalho nem das possibilidades que o Museu apresenta. No entanto, com o passar do tempo e com o distanciamento desses profissionais, não posso dizer ao certo se esse entusiasmo permanece, ainda que muitos deles nos procurem para conversar e trocar ideias. Muitos retornam à universidade perguntado o que fazer, porque quando contratados para trabalhar em escolas municipais, se deparam com projetos que são obrigados a desenvolver, tais como "celebrar as datas cívicas mês a mês." Esses alunos se sentem frustrados, pois precisam lidar com um conceito de história que foi revisto, desconstruído na faculdade. Ainda assim, o que tenho respondido é: Transgrida. Se for obrigado a trabalho o herói, a data considerada melhor e mais importante para a história tradicional, pergunte para seus alunos do que eles sentem falta nessas comemorações. Como você se colocaria nessa história? O mesmo ocorre com o museu.
      Em Goiânia temos o Museu Zoroastro Artiaga, cuja gestão atual tem uma proposta bastante interessante. Ele apresenta bens materiais referentes ao cotidiano de comunidades indígenas da América. No entanto, trata-se de um museu vinculado ao estado de Goiás, e não tem o caráter universitário que torna o Museu Antropológico um espaço singular. Eu penso que todo museu tem potencial, o que buscamos fazer com ele é que faz a diferença. Pode gerar uma transformação profunda, pode não influir em muita coisa, pode reforçar uma concepção oficial de história, mas também pode gerar o não reconhecimento, e até a vontade de mudar tudo.
      Temos um outro "museu" universitário em Goiânia. É, na verdade, o Memorial do Cerrado, de iniciativa da PUC-GOiás. Ele representa um trabalho de estofo, e remonta da história pré colonial até a possibilidade de visualizar casas e utensílios dos períodos colonial e do Império em Goiás. Os alunos e alunas ficam sempre muitos impactados, e impactam o lugar também, mas após a visita ao museu, percebo que o Museu Antropológico tem se apresentado mais como possibilidade pedagógioa do que os demais.
      Espero ter respondido suas questões.
      Cordialmente
      Cristina Helou Gomide

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    2. Respondeu sim, professora. Muito obrigada pela atenção.
      Saudações,
      Maria Sandra da Gama

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  24. Professora Cristina gostaria de parabenizá-la pelo excelente trabalho e pela maneira como nos apresenta esse espaço tão encantador e ao mesmo tempo "esquecido" que são os museus. Os museus são espaços para preservação da história e da memória de um lugar, de um povo, de uma nação ou conjunto delas.
    Particularmente não conheço a história da cidade de Goiás, da transferência da capital e dos demais detalhes que compõem a riquíssima história desse belo Estado; sou do Paraná, todavia o que me chamou a atenção em seu trabalho foi exatamente o fato de voltar-se para o Museu. Moro em uma cidade no interior do Estado do Paraná que carece de um espaço que conte sua história e da região.
    Como acadêmico do Curso de História da Universidade Estadual de Maringá, amante da História e também amante de Museus, sinto-me motivado a "criar" um Museu Regional em nossa cidade para que através desse espaço rico, dinâmico, vivo e sempre em movimento, possamos contribuir para a preservação da História e da Memória local, bem como para a formação de futuros historiadores e museólogos.
    Diante disso, gostaria de perguntar a professora quais as sugestões que você nos daria, quais os caminhos a percorrer para que, de fato, possamos implantar um Museu em nossa cidade?

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    1. Boa tarde Heni Abdu.
      Que bom que pensa na criação de um espaço que represente a história regional. Não é uma tarefa fácil montar um espaço que contemple a todos e todas. No entanto, podemos começar em sala de aula, solicitando que nossos alunos e alunas levem para a sala de aula objetos que marcam sua história e porquê. Feito isso, pergunte de que modo suas memórias estão presentes na história da cidade. Desse modo, se sentirão representados e a criação de um espaço desse tipo deixa ser feita de cima para baixa, envolvendo muitos sujeitos dessa história.
      As narrativas orais também se tornam fundamentais para "fugir" das histórias locai que contam a história de uma grande família e exclui o restante dos moradores.
      Pode-se perceber as representações produzidas sobre a história local à partir das memórias construídas ao longo dos tempos. Devidamente transcritas, essas narrativas podem apresentar de forma rica a diferença entre história local (da elite) e da história regional (que apresenta outros sujeitos da história|).
      Espero que seus anseios tomem forma.
      Cordialmente,
      Cristina Helou Gomide

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  25. Bom dia Profª Cristina,
    Muito interessante o seu texto, pensando os museus como espaços que precisam ser questionados em sua preservação de memórias. Acredito que ainda no Brasil, o conceito de museu ainda se vincula em muitos lugares a guarda de coisas antigas, principalmente dos pioneiros de familias de posse em diversas cidades. Mas refletindo um pouco na possibilidade educativa dos museus, são lugares que contribuem para ajudar os estudantes na discussão sobre o passado e sua relação com o presente e futuro, especialmente , se for questionado. Enquanto professor da educação básica, percebo ainda, que a maioria dos educadores, o utilizam sem metodologia adequada, contribuindo ainda mais para manutenção de um memória oficial e superior. Considerando essa discussão em torno de museus, gostaria que dentro do possivel, comentasse sobre o Museu de Percurso, o que pensas sobre? E que metodologias seriam interessantes para ações educativas, tanto na primeira forma de Museu, quanto no Museu de percurso?
    Abraços
    Sandro Ambrósio Alves

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  26. Olá Sandro.
    É...infelizmente, quando falamos em museu histórico, o que nos vem à mente é essa história que contempla famílias que muitas vezes são consideradas as construtoras das cidades, as pioneiras e responsáveis pelo lugar. Como eu falei em comentários anteriores, embora a visita a tais espaços seja complexa, podendo reforçar essa concepção de história, podemos indagar sobre o museu juntos aos alunos e alunas antes e depois da visita, problematizando a exposição assim como a fala dos guias. Mesmo o não reconhecimento das pessoas com a história exposta, é uma forma de resistência, de interpretação, de colocar-se em "jogo".
    Os museus de percurso são muito interessantes.
    Assim como toda cidade é histórica, independente da data de sua fundação, toda cidade é um grande museu a céu aberto. Ela, por si só, é um espaço carregado de bens materiais que nos conduzem à sua leitura. Desse modo, agregar a isso outras expressões da história, apenas acrescenta à produção do conhecimento e à sensação de pertença.
    Em Goiânia temos o Museu que é a ex casa do interventor Pedro Ludovico Teixeira, denominado "construtor de Goiânia". Normalmente ou com os alunos e alunas ao museu, carregado de uma concepção de história que privilegia sua imagem cristalizada, do herói, do "homem à frente de seu tempo". Depois da visita ao museu, vamos à praça cívica, onde fica o Palácio do Governo e uma estátua do Pedro Ludovico, exposta em cima de um grande pedestal, e ele, em cima de um cavalo, se apresenta de forma monumental. Na mesma praça, placas sobre as construções foram colocadas, de forma a guiar o visitante, mapeando a história da cidade a partir da arquitetura. Nós, eu e os alunos, costumamos indagar tanto sobre o museu quanto sobre o monumento. Todos observamos tanto o trajeto no museu oficial quanto do museu a céu aberto. Nos dois casos, o que fomenta nosso debate é a condução dada à discussão, sobretudo após essa atividade. Instigar os alunos e perguntar o que eles agregariam tanto ao primeiro quanto ao segundo, pode fazer a experiência se tornar ainda mais rica e identitária.
    Espero ter contribuído.
    Cordialmente,
    Cristina Helou Gomide

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  27. Parabéns pelo trabalho e pelas questões levantadas sobe o uso político do museu e da “história oficial” que infelizmente constituem a tônica de nossos museus históricos. Considerando o caso do museu abordado no artigo, como seria possível transcender essa abordagem “congelada” dos fatos históricos e torná-lo mais representativo da comunidade onde está localizado? Obrigado!

    Newton Ribeiro Machado Neto

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